
Li outro dia que os aposentados estão em polvorosa, só para usar um termo igualmente em franca aposentadoria. Os velhinhos gritam, em parte, pelos vencimentos defasados e também porque o jeito é berrar mesmo, afinal, a audição já não é mais a mesma. Alguns nem se recordam do último aumento, como também do nome das pessoas, do que comeram no café-da-manhã e de tomar o remédio contra o Alzheimer. O problema é que, ao contrário dos que estão na ativa, não podem fazer greve, pois já pararam de trabalhar há algum tempo. Fico pensando no dia em que os aposentados, cansados da humilhação da sociedade, resolvam protestar voltando ao batente. Numa certa manhã, você chegaria ao escritório e lá estaria um senhor de pijama, a barba por fazer, jogando paciência no computador, enquanto espera o download da coleção completa de Nelson Gonçalves. No lugar da secretária boazuda, uma vovó de cabelos brancos e xale travaria uma luta com a impressora multifuncional, nostálgica do bom e velho aparelho de telex. E toda atenção ao beber água, para não acabar engolindo uma dentadura esquecida no copo descartável! O único fato ainda familiar seria o chefe continuar trocando o seu nome. As reuniões seriam ainda mais demoradas, interrompidas por constantes ataques de tosse, contagiando os presentes até formar um estranho coral. Restabelecida a ordem, alguém perguntaria “o que eu estava falando, mesmo?” sem que algum dos presentes se lembrasse da resposta. A invasão da mão-de-obra da terceira idade culminaria com uma marcha de chinelos se arrastando até o Planalto, em Brasília, onde o presidente seria deposto. No lugar dele, assumiria o cargo o mais idoso entre os protestantes. O novo mandatário ordenaria a retirada da cadeira presidencial e, como marco da tomada ao poder, instalaria o símbolo maior da aposentadoria: uma confortável cadeira-de-balanço.

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